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RBCE - A revista da



          o objetivo de aprimorá-la, a  m de minimizar os riscos   i) cadeias agroindustriais sustentáveis e digitais para
          de fracasso. A política industrial, lançada em janeiro de   aumentar a segurança alimentar;
          2024, recebeu o nome de Nova Indústria Brasil (NIB),
          porque,  ao  reconhecer  a  dramática  desindustrialização  ii) complexo industrial da saúde, para reduzir as vul-
          prematura  da  economia  brasileira  nas  últimas  décadas,  nerabilidades do Sistema Único de Saúde (SUS) e am-
          estabelece  a  reindustrialização  (que  o  governo  passou  a  pliar o acesso da população aos serviços de saúde;
          denominar “neoindustrialização”) como o processo por
          meio do qual o Brasil poderá promover a reestruturação   iii) infraestrutura, saneamento e mobilidade urbana;
          de sua estrutura produtiva e retomar a trajetória de cat-  iv) tranformação digital da indústria;
          ching up, interrompida desde o início da década de 1980.
                                                                v) bioeconomia e transição energética; e
          Em 2021, publicamos um artigo como Texto para Discus-
          são  na  Universidade  Federal  Fluminense  (Nassif;  Mor-  vi) fomento de tecnologias via Sistema de Defesa. 14
          ceiro, 2021), em que propusemos um formato de política
          industrial  endereçado  a  países  em  desenvolvimento  que  A rationale para que essas seis missões possam gerar re-
          sofreram  desindustrialização  prematura  nas  últimas  dé-  sultados dinâmicos é que elas produzam ações e respos-
          cadas, com propostas especí cas de um programa para o  tas entre si (feedbacks  dinâmicos). Por exemplo, tanto
          Brasil. Baseamo-nos no arcabouço de Mazzucato (2021),  as missões de transformação digital do setor manufatu-
          em que a política industrial deve ser concebida, adotada  reiro quanto a que abarca a bioeconomia e a transição
          e orientada por missões (mission oriented). A abordagem  energética exercem efeitos dinâmicos sobre praticamen-
          de  Mazzucato  implica  que  a  política  industrial  deve  en-  te todas as demais missões.
          volver cooperação entre o governo e o setor privado, com
          participação da sociedade civil, pautando-se por direções,   No que se segue, vou resumir alguns pontos críticos ine-
          prioridades  e  instrumentos  para  alcançar  objetivos  eco-  rentes ao formato da NIB, os quais, poderiam ser, a meu
          nômicos  e  sociais  no  longo  prazo.  Nas  palavras  de  Ma-  juízo, revistos e aprimorados. São eles: 15
          zzucato (2021, p. 8), um plano orientado por missões,  i) Formato excessivamente horizontal das missões
                                                              anunciadas, de que resulta a falta de delimitação mais
            signi ca escolher direções para a economia e selecionar os
            problemas  que  precisam  de  ser  resol idos,  colocando-os  detalhada das prioridades, seja em termos de ativida-
            como  objetivos  centrais  do  sistema  econômico.  Signi ca  des, segmentos ou setores a serem contemplados.
            conceber  políticas  que  catalisem  o  in estimento,  a  ino-  Embora  a  corrente  liberal  seja  mais  condescendente  em
            vação  e  a  colaboração  entre  uma  diversidade  de  agentes  reconhecer  a  adoção  de  políticas  industriais  horizontais
            econômicos, en ol endo tanto empresas quanto cidadãos.  (como  o  estímulo  aos  investimentos  em  P&D,  como  já

          Em nosso paper original, procuramos mostrar que a rein-  discutido), há respaldo teórico e empírico para a combi-
          dustrialização proposta não signi ca apenas reestruturar   nação  desses  instrumentos  com  outros  de  corte  vertical,
          a “velha” indústria de tranformação brasileira, mas, prin-  em que segmentos e setores são priorizados nas escolhas
          cipalmente,  retomar  o  processo  de  industrialização,  por  estratégicas do governo. Embora não seja meu propósito
          meio da revitalização do setor manufatureiro e da promo-  detalhar todos os argumentos em prol da adoção de ins-
          ção de inovações, como estratégia de sustentação do de-  trumentos verticais, basta ressaltar que as escolhas priori-
          senvolvimento econômico e social brasileiro neste século.  tárias devem recair sobre atividades, segmentos ou setores
                                                              com maior potencial de disseminar ganhos de produtivi-
          À semelhança do que propusemos no artigo retromen-  dade (seja via impactos intra e intercadeias produtivas ou
          cionado, a NIB contempla seis missões:              pela difusão de progresso técnico) para a economia como

                                        ............................................................................
         14  As missões que propusemos, originalmente, foram: i) reindustrialização e revitalização industrial; ii) promoção da inovação e criação de vantagens com-
         parativas dinâmicas; iii) formalização do emprego e redução das desigualdades sociais e regionais; iv) ampliação dos investimentos em infraestrutura; v)
         integração com a economia digital; e vi) engajamento na economia verde, por meio da substituição de tecnologias com elevada emissão por baixa emissão
         de dióxido de carbono (CO2). O formato proposto é bastante semelhante ao da NIB, inclusive quanto à recomendação de priorizar o complexo industrial
         da saúde, que, em nosso artigo, foi incorporado como prioridade setorial, e na NIB, como missão. Veja detalhes em Nassif e Morceiro (2021).
         15  Os comentários e sugestões baseiam-se nos documentos divulgados na ocasião de lançamento da NIB, notadamente o “Nova Indústria Brasil: Plano
         de Ação para a Neoindustrialização 2024-2026” e o “Nova Indústria Brasil: Missões, Metas e Ações da Política Industrial”. Estes documentos podem ser
         acessados no website do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).


          Nº  158 - Janeiro, Fevereiro e Março de 2024                                                       49
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