Page 54 - RBCE 158
P. 54

Nova Indústria Brasil


          próximos aos de diversos outros países em desenvolvi-  quanto as três primeiras englobam cadeias com maiores
          mento. Em 2023, a tarifa média de importação aplicada  impactos para trás, por meio dos quais os países exportam
          no Brasil era de 9,4%, contra 9,6% no Vietnam e 8% na  bens  intermediários  embutidos  nas  exportações  dos  de-
          Indonésia.  E  inferior  aos  13,4%  vigentes  na  Coreia  do  mais parceiros comerciais, na cadeia regional da América
          Sul, um país desenvolvido. Logo, não faz sentido associar  do Sul, os impactos são predominantemente para frente,
          a NIB ao recrudescimento do protecionismo no Brasil.  em que os países, fortemente especializados em produtos
                                                              primários, importam a maior parte dos bens intermediá-
          vi) “Como estratégia para aumentar a produtividade,   rios para exportar. No caso do Brasil, particularmente, a
          o Brasil deveria priorizar o engajamento nas cadeias   NIB poderá contribuir para uma mudança desse padrão
          globais de valor.”                                  passivo de inserção nas cadeias globais de valor, ao estimu-
                                                              lar as inovações tecnológicas e, assim, ampliar a participa-
          Essa estratégia implica aumentar o conteúdo importado   ção de produtos manufaturados de maior grau de so sti-
          embutido  no  valor  das  exportações.  O  problema  é  que,  cação tecnológica na pauta de exportações, resultado que
          diante do padrão de especialização regressiva, observado   só poderá ser alcançado no médio e no longo prazo.
          nas últimas duas décadas, nossas exportações  caram ex-
          tremamente  concentradas  em  produtos  primários  e  em   Em suma, a resistência ao retorno das políticas indus-
          commodities industrializadas intensivas em recursos natu-  triais no Brasil parece ser alimentada por preconceitos
          rais (já eram de 66% do total exportado em 2016), com   ideológicos. O problema é que, como esses preconcei-
          reduzido  grau  de  encadeamento  com  os  segmentos  de  tos, muitas vezes reproduzidos pela mídia convencional
          maior produtividade relativa da economia (notadamente,   (articulistas da grande imprensa tradicional e das redes
          manufaturados baseados em engenharia, ciência e conhe-  de televisão), vêm sendo sedimentados desde os idos da
          cimento), ao passo que nossas importações  caram dema-  liberalização comercial, nos anos 1990, a resistência à
          siadamente  concentradas  em  produtos  manufaturados  adoção de políticas industriais parece re etir uma path-
          (88% do total importado), dos quais parte expressiva em   -dependence  negativa, que acaba contribuindo, parcial-
          produtos de média e alta so sticação tecnológica (58%),   mente, para minar os resultados esperados, já que o fra-
          que concorrem direta e indiretamente com nossos forne-  casso tende a ser antecipado por profecias autorrealizá-
          cedores de bens intermediários e de bens  nais (notada-  veis. Daí porque uma das tarefas do governo, na imple-
          mente fornecedores chineses e de países desenvolvidos). 12  mentação da NIB, mas também de outros programas de
                                                              política industrial, é estimular a participação de todos os
          Em  trabalho  empírico  recente,  Marcato  (2023)  divide  atores sociais (empresários, trabalhadores, governo e so-
          as  cadeias  globais  em  quatro  cadeias  regionais  de  valor:  ciedade civil) e, por meio de debates, simpósios e outras
          Europa,  Ásia,  América  do  Norte  e  América  do  Sul.  En-  formas de cooperação, alcançar algum consenso quanto
         “        NIB poderá contribuir para uma              à sua relevância para o desenvolvimento econômico e
                                                              social.  A nal, para que essa resistência seja amorteci-
                                                                    13
                  mudança desse padrão passivo de             da, é preciso que a maioria se convença de que a política
                                                              industrial, se bem desenhada, executada, coordenada e
                inserção nas cadeias globais de valor,        monitorada, poderá se traduzir em jogo de soma positi-

                ao estimular as inovações tecnológicas        va, e não em jogo de soma zero, no longo prazo.
                  e, assim, ampliar a participação de
                 produtos manufaturados de maior              A “NOVA INDÚSTRIA BRASIL”  NIB :
                 grau de so sticação tecnológica na           UMA AVALIAÇÃO CRÍTICA PRELIMINAR
               pauta de exportações, resultado que só
                 poderá ser alcançado no médio e no           O  propósito  desta  seção  é  fazer  uma  breve  avaliação
                                                              preliminar da nova política industrial brasileira. Eventu-
                             longo prazo                      ais  críticas  com  respeito  ao  seu  formato  são  feitas  com
                                                        ”


                                        ............................................................................
          12  Ver Nassif e Castilho (2020, p.687).
          13  Como salienta Stiglitz (2021, p. 311), “uma estratégia abrangente de desenvolvimento deve abarcar metas de crescimento econômico inclusivo, com
          participação inclusiva, incluindo o equilíbrio entre governo, mercados e sociedade, com base nos novos entendimentos sobre o que leva à transformação
          econômica e social bem sucedida”.

         48                                                                   Nº  158 - Janeiro, Fevereiro e Março de 2024
   49   50   51   52   53   54   55   56   57   58   59