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RBCE - A revista da
mação e dos serviços high-tech como motores do cresci-
mento econômico e base de sustentação do incremento
da produtividade, no longo prazo. Enquanto alguns des-
ses dogmas, que ecoaram na imprensa tão logo foram di-
vulgadas as linhas gerais da NIB, são mitos que podem
ser refutados pela teoria econômica e pelas evidências
empíricas, outros são dogmas meramente ideológicos,
que podem ser rejeitados pelo bom senso. São eles: 1
i) “Uso de estímulos governamentais reduz a e ciên-
cia na alocação dos recursos produtivos.”
Trata-se de uma proposição neoclássica, baseada no
pressuposto de que o livre funcionamento das forças
de mercado, tanto internas (laissez-faire) quanto ex-
ternas (livre-comércio internacional), assegura a máxi-
ma e ciência alocativa, distributiva e nas condições de
Imagem de Gerd Altmann por Pixabay
bem-estar (ótimo de Pareto). A defesa do laissez-faire
no mercado interno ampara-se na premissa de que, sob
condições de concorrência perfeita, os preços relativos
funcionam como sinalizadores exclusivos e mais e cien-
tes da alocação de recursos e da distribuição das rendas
geradas no sistema produtivo.
POLÍTICA INDUSTRIAL: Já sob a ótica do livre uxo de mercadorias e serviços no
DESFAZENDO MITOS mercado internacional, a proposição está relacionada ao
princípio ricardiano das vantagens comparativas, segundo
No dia seguinte ao anúncio da NIB, houve enorme re- o qual a máxima e ciência é alcançada apenas quando cada
percussão negativa com respeito ao esboço geral do pla- país se conforma a um padrão de especialização ancorado
no. O jornal Valor Econômico, por exemplo, publicou, no naquilo que produz com maior rendimento relativo. O
dia 23 de janeiro de 2024, matéria com o título “Nova problema é que os resultados dessas proposições só seriam
Política Industrial tem R$300 bi e algumas dúvidas” e válidos se, de fato, no mundo real prevalecessem condi-
subtítulo “Sob críticas por retomada de práticas antigas, ções ideais de concorrência perfeita em todos os mercados
governo propõe modernizar setor; falta de clareza em (bens, serviços e fatores de produção, inclusive nanceiros).
alguns pontos preocupa”. Matérias semelhantes foram
também publicadas pelos jornais Folha de São Paulo, O
Estado de São Paulo e O Globo no mesmo dia. Embora
algumas dessas críticas pautem-se pela racionalidade,
como, por exemplo, a falta de detalhamento com respei- “
to à quanti cação das metas, aos instrumentos de polí- Como no mundo real prevalecem
tica e ao acompanhamento e cobrança dos resultados,
a maioria delas revelou enorme resistência ideológica à retornos crescentes de escala e
adoção de política industrial como estratégia de política externalidades de toda ordem, não há
pública em prol do desenvolvimento econômico e social. qualquer garantia de que laissez-faire
Essa resistência re ete, em parte, uma visão tecnocrática e livre-comércio puro assegurem os
a respeito do papel do Estado na promoção do desenvol- resultados de máxima e ciência
vimento, mas também a incorporação de dogmas teóri-
cos equivocados sobre o papel da indústria de transfor- ”
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1 Esses dogmas re etem, como já dito, os posicionamentos – açodados, na maioria – de economistas e analistas, registrados pelos jornais brasileiros no dia
seguinte ao lançamento da NIB. Com uma simples consulta na web, o leitor interessado pode acessar a repercussão da NIB nos jornais e data mencionados.
Nº 158 - Janeiro, Fevereiro e Março de 2024 45