Page 46 - RBCE 158
P. 46

Relações Econômicas Brasil e China


          para metas e resultados do que o estilo chinês, coletivista,   relevante  e  essencial  a  capacidade  das   rmas  de  viverem
          circular, holístico e que dá muito valor aos processos para   em ambientes experimentais, de ambiguidades e incerte-
          construir  parcerias  e  relacionamentos  (Shimutwikeni,  zas  (Johanson  e  Vahlne,  1977;  2009ab).  O  empreende-
          2012). Compreender as motivações por trás das posturas  dorismo em redes propicia a possibilidade de reconhecer
          dos chineses e reconhecer as nuances culturais são funda-  oportunidades e gerar conhecimento, o que não precisa
          mentais para estabelecer relações mais sólidas e constru-  ser linear e nem “um luxo para as empresas maiores e mais
          tivas, promovendo as bases de um relacionamento dura-  fortes” (Nummela, Saarenketo e Puumalainen, 2004).
          douro e de uma comunicação colaborativa.
                                                              No  Brasil,  muitas  empresas  de  pequeno  e  médio  porte
          A não compreensão dos elementos culturais em sua pro-  não se sentem preparadas para o mercado chinês. Algu-
          fundidade, e o apego a questōes de cultura mais supér u-  mas  vezes,  nem  mesmo  as  grandes.  O  resultado  disso  é
          as, que, em realidade, são apenas regras de etiqueta, como   que, para consultores e prestadores de serviços especiali-
          “segure  os  cartōes  de  visita  com  as  duas  mãos”,  “troque  zados em China, acabamos por ter que atuar como inter-
          presentes”,  “participe  de  jantares  regados  a  baijiu  (o  fa-  mediadores ou traders na parte comercial, para commo-
          moso  licor  branco  chinês)”,  podem  ocasionar  estragos  dities e outras mercadorias mais básicas, e tendo menos
          em contratos e parcerias. Como alertam Graham e Lam  oportunidades em atuar para desenvolver novos projetos
          (2003) os chineses estão invadindo as escolas de negócios  e atender a empresários do setor de bens de consumo que
          para compreender conceitos e valores ocidentais, como o  estejam  dispostos  a  investir  para  modi car  abordagens,
          de imagem corporativa e de propriedade intelectual, ao   adaptar  produtos  e  aderir  a  um  modelo  de  negócio  es-
          passo que, para os ocidentais, a compreensāo da cultura  peci camente  direcionado  para  conquistar  o  mercado
          chinesa ainda permanece um grande desa o.           chinês. Como traders de commodities,  camos limitados
                                                              a atuar como agentes e distribuidores, conectando com-
          Outro  problema  que  tenho  notado  em  meus  contatos  pradores e vendedores de mercadorias básicas. E, depen-
          com clientes ou potenciais clientes brasileiros é que mui-  dendo do projeto, nem sempre temos o capital para atuar
          tos  ainda  hesitam  em  considerar  a  China  como  destino  em grandes operações de grãos e minérios, que acabam
          de exportação. Mesmo possuindo produtos inovadores e   por dominar as exportações brasileiras para a China.
          competitivos, estão presos à concepção de que, para inter-
          nacionalizar seus negócios, é necessário primeiro consoli-  Essas  limitações  no  tipo  de  operação  e  de  produtos,  e,
          dar presença nos países vizinhos, como Argentina ou Bo-  ainda, a escassa representatividade brasileira na China e
          lívia e, só depois, considerar expandir para países mais dis-  a  insistência  em  visitas  pontuais  ao  país,  em  vez  de  ter
          tantes — ideia já desmisti cada na Academia, quando os  uma presença contínua no mercado, não contribui com
          professores Jan Johanson e Jan-Erik Vahlne, da Universi-  a adaptabilidade do empresário brasileiro à China e com
          dade de Upsala, inovaram a teoria comportamental sobre  a geração de negócios novos e diferentes. Segundo infor-
          a  internacionalização  de  empresas,  recriando,  em  2009,  mações do embaixador Gilberto Guimarães, então côn-
          as  suas  teorias  de  1977,  e  passando  a  reconhecer  como  sul do Brasil em Xangai, em 2021, havia, dentro da área
                                                              da jurisdição do consulado, não mais do que 100 empre-
                                                              endedores brasileiros (Entrevista..., 2021).

         “                                                    Considerando só que municipalidade do  Consulado-Geral
                                                                                a
                                                                                   jurisdição
                                                                                                            tem
                                                                                                        que
                                                              abrange
                                                                             a
                                                                      não
                                                                                             de
                                                                                                Xangai,
                                                                                                      províncias
                                                                         de
                                                                                                    as
                                                                 milhões
                                                                            habitantes,
                                                                                           também
                                                                                       mas
                                                              25
                  Os chineses estão invadindo as
               escolas de negócios para compreender           de Jiangsu, Anhui, Shandong e Zhejiang, que totalizam
                                                              mais 313 milhões de pessoas (MRE, 2023), ter 100 em-
                conceitos e valores ocidentais, como          presários ali nesse espaço é realmente um número mui-
                   o de imagem corporativa e de               to  pouco  expressivo.  Levantamento  do  MRE  em  2022
               propriedade intelectual, ao passo que,         mostra  que  o  número  total  de  brasileiros  residindo  na
                                                              China é de 5,9 mil (Veja..., 2023). A grande maioria não
                 para os ocidentais, a compreensāo            faz,  portanto,  parte  da  limitada  comunidade  empresa-
                da cultura chinesa ainda permanece            rial. Com frequência, são jovens que vão se aventurar ou
                         um grande desa o                     estudar e não têm a oportunidade de se envolver em ne-
                                                              gociações empresariais, elaboração de contratos e toma-
                                                        ”     da de decisões táticas e estratégicas.
         40                                                                   Nº  158 - Janeiro, Fevereiro e Março de 2024
   41   42   43   44   45   46   47   48   49   50   51