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Relações Econômicas Brasil e China
para metas e resultados do que o estilo chinês, coletivista, relevante e essencial a capacidade das rmas de viverem
circular, holístico e que dá muito valor aos processos para em ambientes experimentais, de ambiguidades e incerte-
construir parcerias e relacionamentos (Shimutwikeni, zas (Johanson e Vahlne, 1977; 2009ab). O empreende-
2012). Compreender as motivações por trás das posturas dorismo em redes propicia a possibilidade de reconhecer
dos chineses e reconhecer as nuances culturais são funda- oportunidades e gerar conhecimento, o que não precisa
mentais para estabelecer relações mais sólidas e constru- ser linear e nem “um luxo para as empresas maiores e mais
tivas, promovendo as bases de um relacionamento dura- fortes” (Nummela, Saarenketo e Puumalainen, 2004).
douro e de uma comunicação colaborativa.
No Brasil, muitas empresas de pequeno e médio porte
A não compreensão dos elementos culturais em sua pro- não se sentem preparadas para o mercado chinês. Algu-
fundidade, e o apego a questōes de cultura mais supér u- mas vezes, nem mesmo as grandes. O resultado disso é
as, que, em realidade, são apenas regras de etiqueta, como que, para consultores e prestadores de serviços especiali-
“segure os cartōes de visita com as duas mãos”, “troque zados em China, acabamos por ter que atuar como inter-
presentes”, “participe de jantares regados a baijiu (o fa- mediadores ou traders na parte comercial, para commo-
moso licor branco chinês)”, podem ocasionar estragos dities e outras mercadorias mais básicas, e tendo menos
em contratos e parcerias. Como alertam Graham e Lam oportunidades em atuar para desenvolver novos projetos
(2003) os chineses estão invadindo as escolas de negócios e atender a empresários do setor de bens de consumo que
para compreender conceitos e valores ocidentais, como o estejam dispostos a investir para modi car abordagens,
de imagem corporativa e de propriedade intelectual, ao adaptar produtos e aderir a um modelo de negócio es-
passo que, para os ocidentais, a compreensāo da cultura peci camente direcionado para conquistar o mercado
chinesa ainda permanece um grande desa o. chinês. Como traders de commodities, camos limitados
a atuar como agentes e distribuidores, conectando com-
Outro problema que tenho notado em meus contatos pradores e vendedores de mercadorias básicas. E, depen-
com clientes ou potenciais clientes brasileiros é que mui- dendo do projeto, nem sempre temos o capital para atuar
tos ainda hesitam em considerar a China como destino em grandes operações de grãos e minérios, que acabam
de exportação. Mesmo possuindo produtos inovadores e por dominar as exportações brasileiras para a China.
competitivos, estão presos à concepção de que, para inter-
nacionalizar seus negócios, é necessário primeiro consoli- Essas limitações no tipo de operação e de produtos, e,
dar presença nos países vizinhos, como Argentina ou Bo- ainda, a escassa representatividade brasileira na China e
lívia e, só depois, considerar expandir para países mais dis- a insistência em visitas pontuais ao país, em vez de ter
tantes — ideia já desmisti cada na Academia, quando os uma presença contínua no mercado, não contribui com
professores Jan Johanson e Jan-Erik Vahlne, da Universi- a adaptabilidade do empresário brasileiro à China e com
dade de Upsala, inovaram a teoria comportamental sobre a geração de negócios novos e diferentes. Segundo infor-
a internacionalização de empresas, recriando, em 2009, mações do embaixador Gilberto Guimarães, então côn-
as suas teorias de 1977, e passando a reconhecer como sul do Brasil em Xangai, em 2021, havia, dentro da área
da jurisdição do consulado, não mais do que 100 empre-
endedores brasileiros (Entrevista..., 2021).
“ Considerando só que municipalidade do Consulado-Geral
a
jurisdição
tem
que
abrange
a
não
de
Xangai,
províncias
de
as
milhões
habitantes,
também
mas
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Os chineses estão invadindo as
escolas de negócios para compreender de Jiangsu, Anhui, Shandong e Zhejiang, que totalizam
mais 313 milhões de pessoas (MRE, 2023), ter 100 em-
conceitos e valores ocidentais, como presários ali nesse espaço é realmente um número mui-
o de imagem corporativa e de to pouco expressivo. Levantamento do MRE em 2022
propriedade intelectual, ao passo que, mostra que o número total de brasileiros residindo na
China é de 5,9 mil (Veja..., 2023). A grande maioria não
para os ocidentais, a compreensāo faz, portanto, parte da limitada comunidade empresa-
da cultura chinesa ainda permanece rial. Com frequência, são jovens que vão se aventurar ou
um grande desa o estudar e não têm a oportunidade de se envolver em ne-
gociações empresariais, elaboração de contratos e toma-
” da de decisões táticas e estratégicas.
40 Nº 158 - Janeiro, Fevereiro e Março de 2024