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RBCE - A revista da



          últimos anos: R$1,55 por Dólar, a “guerra cambial” era
          uma realidade concreta no Brasil e fazia mortos e feridos   “
          no mundo empresarial.                                        Pensei comigo: O que? Um fundo
                                                                        soberano da China operando nos
          Para o Ministro Mantega, a elevada taxa básica de juros
          brasileira (SELIC), naquele momento a 10,75% ao ano,      bastidores do mercado futuro de câmbio
          favorecia intensamente aos investidores estrangeiros, cada   no Brasil com objetivo não de apenas de
          vez mais atraídos pelos altos rendimentos de suas aplica-  lucrar em cima de nossa disfuncionalidade
          ções no país. Ele citou na sua entrevista, por exemplo, o
          Japão. “A taxa de juros lá é muito baixa, de 0,5% a 1%. Um   macroeconômica, mas principalmente de
          poupador japonês toma o dinheiro lá emprestado, vem aqui,   sobrevalorizar o Real e assim tornar as
          aplica a 10,75% e ganha a diferença. Isso pode ser feito em   importações chinesas cada dia mais
          dólares, ou em outras moedas”, criticou. O Ministro tinha
          perfeita noção do grave prejuízo à economia nacional que     baratas para o mercado brasileiro!
          esta disparidade cambial causava e sabia que era impres-        Isto era nitroglicerina pura!
          cindível combatê-la da melhor forma possível.

          Concluiu sua entrevista naquele dia com esta a rmação:                                            ”
          “Nós estamos preocupados em não permitir que o Real se
          valorize mais do que já está por conta de manipulação  O primeiro artigo foi publicado na Folha de São Paulo
          cambial e não vamos permitir assim que se prejudique  no dia 8 de Agosto de 2011 tinha o provocativo título
          ainda mais os exportadores brasileiros nem aqueles que  de “Mitos e Mistérios do Mercado de Câmbio no Bra-
          produzem para o mercado local, que passa a ter concor-  sil”. Dias depois da publicação deste artigo recebo um
          rência a preços muito baixos dos importadores”, a rmou.  telefonema do então presidente da FIESP, Paulo Skaf,
                                                              preocupado com a repercussão de meu artigo e dos ru-
          Logo após o retorno do Ministro Guido Mantega ao Bra-  mores de que teria sido eu quem sugeriu a taxação de
          sil, realizamos uma reunião em seu Gabinete em Brasília   IOF na posição vendida de Real no mercado futuro de
          e o que se propunha era uma alíquota de IOF (Imposto   câmbio, e que isto teria afetado drasticamente o volume
          sobre Operações Financeiras) sobre as posições vendidas   de operações na então BM&F, a ponto que seu presiden-
          de Real no mercado futuro de câmbio. Isto estava na alça-  te e diretoria haviam solicitado uma reunião no Con-
          da do Conselho Monetário Nacional (CMN) e poderia   selho Superior de Economia da FIESP para debater o
          ser tomada imediatamente sem demora nem burocracia,   assunto, e obviamente eu deveria estar presente para me
          para  pegar  o  mercado  de  surpresa  e  causar  um  prejuízo  defender, e defender a FIESP e a indústria brasileira.
          nas operações de “carry trade”. Concluímos avaliando que
          a  maioria  dos  investidores  era  covarde  e  avessa  ao  risco,  O Conselho Superior de Economia da FIESP era en-
          e  iriam  desmontar  o  carregamento  das  posições  vendi-  tão presidido por ninguém menos que o ex-Ministro da
          das de Real no mercado futuro de câmbio a partir deste  Fazenda Antônio Del m Netto, que além de ser meu
          anuncio. Parece que o Ministro Mantega gostou daquela  amigo pessoal, havia sido meu professor na Faculdade
          sugestão e de pronto concluímos a reunião.          de Economia da USP nos anos 60. Sabia de antemão de
                                                              sua posição como economista de primeiro time, sempre
          No dia seguinte lá estava a decisão do CMN na primeira   defensor de um regime de livre  utuação cambial, mas
          página dos jornais, pegando muita gente de surpresa. A   disposto a intervir pela ação da autoridade monetária
          expectativa era de que esta estratégia de fato funcionas-  para evitar sub e sobrevalorização cambial e suas conse-
          se, e daí veio minha outra tarefa de escrever artigos de-  quências nefastas no setor produtivo da economia.
          fendendo o implacável combate a sobrevalorização cam-
          bial imposta à economia brasileira pela manipulação  Preparei a reunião com empenho e fui acompanhado de
          cambial praticada pelos bancos. Inspirado pelos fatos  meus  dois  gurus  em  matéria  cambal:  Emilio  Garofalo  e
          e descobertas recentes, eu escrevi dois artigos que julgo   Pedro  Rossi.  Creio  que  nos  saímos  muito  bem,  rebate-
          terem causado algum impacto no mercado cambial, já  mos com destreza todas as críticas e no  nal ganhamos o
          que como economista, ex-Secretário Executivo da CA-  apoio do Professor Del m Netto e os aplausos dos demais
          MEX, e Diretor da FIESP, minha opinião era alvo de  presentes. Só os Diretores da BM&F que obviamente não
          atenção de operadores de comércio exterior, de câmbio,  gostaram nada de nossa apresentação e dos argumentos a
          e de autoridades do Governo.                        favor das medidas adotadas dias antes pelo CMN.


          Nº  157 - Outubro, Novembro e Dezembro de 2023                                                     31
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