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Câmbio


          Ricardo Ferraço (PSDB/ES). Foram convocados repre-  se o STF reconhece a aplicação do Código de Defesa do
          sentantes do setor privado, nomeadamente FEBRA-     Consumidor,  o  qual  prevê  espécie  de  responsabilidade
          BAN (Federação Brasileira de Bancos), AEB (Associa-  civil,  às  instituições   nanceiras,  não  parece  exagero  ad-
          ção de Comércio Exterior do Brasil), e FIESP, além de  mitir o emprego no art. 927 do Código Civil neste caso
          representantes do Banco Central do Brasil, do próprio  especí co.  Ademais,  o  direito  de  reparação  é  garantia
          CADE, e do Ministério da Justiça. Obviamente a FE-  constitucional decorrente do inciso XXXV do art. 5º: “a
          BRABAN não compareceu, o Diretor do Banco Cen-      Lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário qual-
          tral negou qualquer indício de manipulação cambial e  quer lesão ou ameaça a direito”. Ficava bem entendido que
          que as rígidas regras regulatórias de supervisão do mer-  neste tipo de processo era preciso provar o crime (ação
          cado de câmbio no Brasil impediam qualquer tentativa  em conluio por um grupo de agentes para in uenciar ou
          de in uenciar a formação da PTAX e por aí afora. Já  determinar um preço, no caso a taxa de câmbio), o nexo
          o presidente da AEB e eu pela FIESP demos conheci-  causal (o efeito desta ação ilícita sobre o reclamante), e
          mento aos parlamentares de nossas impressões sobre o  o tamanho do dano sofrido (no caso o efeito da sobre-
          potencial de manipulação da taxa PTAX e os prejuízos  valorização  cambial  ocorrida  na  receita  de  exportação
          que haviam sido causados a indústria brasileira em geral   do reclamante). Não pairava dúvidas: eram evidentes os
          e aos exportadores em geral. O representante do CADE  elementos básicos deste processo e que caberia sim uma
          por razões de ofício e de sigilo foi bastante comedido na  ação coletiva em nome de centenas ou milhares de expor-
          sua apresentação e nada acrescentou de novo.        tadores prejudicados pela atividade ilícita dos bancos.

          O importante desta audiência pública foi de que ali nas-  Depois de conversas com muitos notáveis juristas brasilei-
          ceu o consenso de que além do processo público já em  ros, foi escolhido um especialista em Direito Econômico e
          curso pelo CADE, havia motivo mais do que justo para  ações contra cartéis, o jovem e brilhante advogado Bruno
          instalação de outro processo de natureza indenizatória e  Maggi,  que  imediatamente  abraçou  a causa,  pressentindo
          de ação coletiva, desta vez na esfera privada, por iniciati-  ali não apenas a chance de uma retumbante vitória jurídi-
          va da AEB, representando o universo de seus Associados  ca, mas principalmente a reparação de um gigantesco dano
          e todos os exportadores brasileiros que foram indireta-  causado  pelos  bancos  aos  seus  próprios  clientes,  milhares
          mente lesados na sua atividade exportadora por conta da   de  empresas  exportadoras  brasileiras  de  grande,  médio,  e
          sobrevalorização cambial gerada pela manipulação da  pequeno porte, de vários segmentos da indústria, e de vá-
          PTAX pelos bancos nacionais e estrangeiros envolvidos  rias regiões do país, todas elas vítimas anônimas do crime
          no processo de cartelização pelo CADE.              de  cartel  praticado  irresponsavelmente  pelos  bancos  de
                                                              2009 a 2011 segundo a investigação do CADE.
          Segundo a Lei Antitruste, em seu art. 47, “é garantido
          aos prejudicados por in ações à ordem econômica o direi-  No dia 7 de Dezembro de 2016 um novo processo é ins-
          to de ação civil para obter o ressarcimento pelas perdas e  taurado pelo CADE, desta vez envolvendo 11 institui-
          pelos danos so idos”. Esse direito é garantido tanto aos  ções  nanceiras no Brasil e se referindo ao mercado de
          particulares que se sentirem prejudicados quanto ao Mi-  câmbio onshore aqui já referido. Neste segundo processo
          nistério Público na tutela dos interesses difusos. A aula  o CADE deu sequencia as investigações que apuravam
          de Direito de Defesa Econômica veio a calhar naquele  indícios de práticas adotadas por instituições  nancei-
          momento. Para obter a reparação civil por danos con-  ras no Brasil para manipular as cotações do Real com o
          correnciais, devem ser satisfeitos os requisitos previstos  Dólar, desta feita agindo em conluio no mercado futuro
          no caput do art. 927 do Código Civil: “i) o ato praticado  da B3,  xando taxas que iriam lhes proporcionar maio-
          deve con gurar ilícito; ii) deve ocorrer dano; e iii) é preciso  res lucros nas rolagens de contratos futuros de câmbio
          que exista nexo de causalidade entre a conduta e o dano.”  a cada  nal de mês. No inquérito do mercado onshore,
          Ademais, a regra adotada por nosso ordenamento jurí-  muito embora as provas da atuação do Cartel fossem
          dico é a de que a responsabilidade civil é subjetiva, isto é,  robustas, de inicio, num pacto de silêncio, nenhuma ins-
          só há responsabilidade se restar comprovado dolo.   tituição havia  rmado até então qualquer compromisso
                                                              de leniência com o órgão, na expectativa de que seria
          De acordo com nosso parecer não deveria haver maio-  uma admissão antecipada de culpa.
          res celeumas quanto à aplicabilidade do Código Civil
          para responsabilização das instituições  nanceiras nos  Nesse caso, estavam sendo investigados os bancos BBM,
          casos de reparação civil por danos concorrenciais, haja  BNP Paribas, BTG Pactual, Citi, HSBC (hoje, parte do
          vista que a responsabilidade civil se distancia do que se-  Bradesco). Com menor intensidade, ABN Amro Real
          ria concernente à “estrutura” do sistema  nanceiro. Ora,  (hoje Santander), Fibra, Itaú Unibanco, Santander e

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