Page 17 - RBCE 154
P. 17
RBCE - A revista da
intensivos em recursos naturais renováveis e não renová- do tamanho do mercado brasileiro. De fato, as MNEs
veis – são inseridos nas GVCs num contexto de tour de olhavam para o mercado interno brasileiro, e não se in-
force e de crise de balanço de pagamentos no Brasil no teressavam em direcionar parte da sua produção para o
primeiro quinquênio dos anos 1980. Esses setores, no mercado externo. E, quando isso ocorria, quando surgia
Brasil, foram instalados em decorrência do Primeiro e interesse, era para a exportação de parte da produção lo-
Segundo PND (Plano Nacional de Desenvolvimento) cal do Brasil, sempre com forte componente importado,
fruto dos vazios observados na estrutura da economia preferencialmente para a América Latina e a África. De
brasileira pois quase inexistiam empresas ou grupos em- fato, essa orientação externa “forçada” para o exterior
presariais ligados à indústria de transformação. foi fruto do incentivo e da “obrigação” que as MNEs no
Brasil tiveram ao participar do chamado Programa Be-
À época, esperava-se que essas “novas” empresas atende- fiex (incentivos fiscais às exportações), das permissões
riam preferencialmente ao mercado doméstico, mas, em de importações obtidas no Programa de Importação ou
função do processo de análise de projetos industriais fei- de conteúdo local que vigoraram ao longo do período
to pelo então BNDE para financiar em moeda nacional de crise do balanço de pagamentos e da dívida externa.
da época a instalação dessas unidades industriais com
alguma folga extra na produção, este exigia que as novas Simbolicamente, o ano de 1990 representa uma ruptura
indústrias deveriam contar com um nível de maquinaria de política e de prática na economia brasileira. Encerra-se,
ou de bens de capital de classe mundial, aprovado junto oficialmente, o período de substituição de importação.
à Cacex sob a forma de Acordo de Participação. Mas, em função das disposições contidas na Constitui-
ção de 1988, as medidas e os incentivos existentes no
Isso permitiu que fosse constituído no final dos anos período anterior à promulgação desta Constituição
1970 um parque da indústria de transformação moderno, para as exportações – como acesso e existência de linha e
tecnologicamente sofisticado, capaz de atender ao ma- fundos para financiamento às exportações; dispensa de
ximercado (composto pelo mercado interno e externo), direito de regresso de bens em função da não existência
quando ocorreu a crise do balanço de pagamentos de de seguro de crédito às exportações; disponibilidade de
1980, e a maxidesvalorização de 1983. Com a maxides- informações comerciais para suprir falhas de mercado
valoriazação, com apoio de financiamento pré e pós- de promoção comercial, e até a não incidência de tribu-
embarque da Cacex/BB, e sobretudo por haver a obri- tos – não foram recepcionados no novo arcabouço legal
gatoriedade de os bancos credores internacionais oferta- e jurídico e, então, foram extintos.
rem linhas de créditos ao bancos comerciais no Brasil, as
empresas da indústria de transformação de bens inten-
sivos em recursos naturais renováveis e não renováveis
foram se inserindo em GVCs – produtora ou compra-
dora – de uma forma um pouco híbrida a partir da crise
dos anos 1980, seja internacionalizando suas atividades,
seja sofrendo a incidência de ações do chamado novo
protecionismo conseguindo deslocar a oferta produtiva
doméstica nos países desenvolvidos por serem unidades “
industriais modernas para a época e muito competitivas. É preciso compreender que a
Todos os exemplos de inserção em GVC, no Brasil, des- industrialização liderada pela
critos acima muito contribuíram para a geração durante exportação com engajamentos em
os anos 1980 de superávits na balança comercial brasi- GVCs dirigidos por produtores, no
leira. Por sua vez, isso permitiu que a restrição externa Brasil, sempre foi singular por causa
à economia brasileira observada nos anos 1980 e 1990
fosse gradualmente sendo relaxada, a ponto de, anos à do tamanho do mercado brasileiro.
frente – primeiro decênio dos anos 2000, o Brasil con- De fato, as MNEs olhavam para o
seguir quitar a dívida externa sob responsabilidade do mercado interno brasileiro, e não se
governo brasileiro.
interessavam em direcionar parte da
É preciso compreender que a industrialização liderada sua produção para o mercado externo
pela exportação com engajamentos em GVCs dirigidos
”
por produtores, no Brasil, sempre foi singular por causa
Nº 154 - Janeiro, Fevereiro e Março de 2023 13