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Desa os Tributários


          Por isso, um regime cumulativo estimula a verticalização  Ao contrário de outros países que tributam o valor agre-
          em que as empresas tentam controlar todos os estágios  gado por meio de um imposto único, o Brasil optou por
          do processo produtivo, perdendo as vantagens competi-  implementar um conjunto de cinco tributos de compe-
          tivas decorrentes da especialização.                tências federativas distintas, compreendendo três im-
                                                              postos (IPI, ICMS e ISS) e duas contribuições sociais
          Para focar o ônus no valor agregado e excluir os impos-  (PIS/Pasep e Co ns). A falta de homogeneidade por si
          tos embutidos nos preços, foram concebidos os regimes   só lança um desa o bastante complexo para se estabe-
          não cumulativos. Ao contrário do que se vê na cascata   lecer qualquer sistema de compensação e ressarcimento
          que acabamos de descrever, o tributo suportado pelo  que caracterize um regime não cumulativo. Além disso,
          comprador se transforma em crédito a seu favor. Pos-  o próprio texto atual da Constituição Federal autoriza
          teriormente, quando há a revenda, repete-se o ritual:  regimes cumulativos no ISS e nas contribuições sociais.
          o comprador seguinte faz o pagamento ao revendedor,   E quando a mesma Constituição faz referência à não
          que se incumbe de recolher o tributo. Dessa vez, contu-  cumulatividade no IPI e no ICMS, uma série de exce-
          do, o revendedor pode abater o imposto que recolheu  ções impede que a regra se replique no ordenamento de
          na operação anterior. Como ocorre uma compensação,   modo transparente e consistente. Finalmente, o ICMS
          eliminando-se o que foi desembolsado na operação ori-  adota um mecanismo de tributação que autoriza o es-
          ginal, não se acumula carga tributária. Assim, o imposto   tado de origem a tributar parcialmente uma operação
          incide exclusivamente sobre o valor agregado, e não mais   comercial, o que di culta o reconhecimento de créditos
          sobre o próprio tributo que fora cobrado anteriormen-  nas transações interestaduais.
          te. Com essa fórmula, abre-se uma avenida larga para a
          criatividade e a especialização nas cadeias produtivas,  Em função dessas características do nosso sistema tribu-
          favorecendo-se a oferta de novas vagas de emprego e o  tário,  observa-se  que  o  Brasil  ainda  tributa  a  produção
          ingresso de mais investimentos na economia.         em vez de tributar exclusivamente o consumo. Sob esse
                                                              prisma,  a  oneração   scal  avança  além  do  valor  agrega-
                                                              do, desestimulando a formação de elos nas cadeias pro-
          O SISTEMA BRASILEIRO ATUAL E A                      dutivas. O carregamento desse peso  scal em cada uma
          REFORMA TRIBUTÁRIA                                  das  operações  até  a  venda   nal  passou  a  ser  conhecido
                                                              como resíduo tributário. Trata-se de um problema que se
                                                              agrava à medida que aumenta a complexidade da cadeia
          Como já foi explicado, cada operação tributada gera um
          crédito correspondente a favor do adquirente, caso em-  produtiva afetada, atingindo especialmente as empresas
          pregue o produto ou serviço em seu processo produtivo.   exportadoras.  O  ônus  do  resíduo  tributário  acaba  por
          Trata-se de uma medida para evitar cumulatividade. À   ser incorporado ao preço  nal dos produtos exportados,
          medida que passa adiante o seu produto, a empresa pode   abalando a competitividade do país no mercado interna-
          compensar esse crédito na próxima operação tributada.   cional. Nota-se que esse efeito da cumulatividade vai na
          Em linhas gerais, assim funciona um regime não cumu-  contramão  das  políticas  adotadas  pelos  diversos  países
          lativo pleno. E como funciona atualmente no Brasil?  que empregam a sistemática de tributar o valor agregado.
                                                              A reforma tributária em tramitação no Congresso Na-
                                                              cional tem como foco a tributação incidente sobre pro-
         “       O Brasil ainda tributa a produção            dução e consumo. O propósito é desonerar a produção,
                                                              concentrando a carga  scal exclusivamente no consumo.
                 em vez de tributar exclusivamente            No centro do sistema proposto encontra-se a orientação
                                                              pela não cumulatividade plena, a ser alcançada por um
                  o consumo... O ônus do resíduo              esquema nacional, baseado em cooperação federativa,
               tributário acaba por ser incorporado           voltado para a tributação no destino e fundado na devo-

                    ao preço  nal dos produtos                lução pronta e efetiva de créditos às empresas. A estraté-
                                                              gia adotada pelo governo, em conjunto com o Congres-
                      exportados, abalando a                  so Nacional, consistiu em aproveitar a PEC 45/2019,
                    competitividade do país no                que já havia passado pela Comissão de Constituição e
                       mercado internacional                  Justiça e de Cidadania (CCJC) e pela Comissão Espe-
                                                              cial, ambas da Câmara dos Deputados, para introduzir
                                                        ”     um texto substitutivo diretamente no Plenário a partir


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