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RBCE - A revista da




          consolidadas, como níveis máximos, alíquotas acima  tro lado, subsetores competitivos do setor de bens de
          das efetivamente praticadas, sob um teto geral no nível  capital brasileiro terão oportunidades ampliadas com
          de 35%. A abertura comercial unilateral, levada a cabo  o acordo, graças ao acesso privilegiado e espaço para
          pelo governo Collor, foi a base tanto para esses com-  parcerias no mercado europeu.
          promissos multilaterais, quanto para o movimento de
          negociação de acordos preferenciais regionais amplos,   Nesse contexto, a indústria de bens de capital que exis-
          iniciado na década de 1990 a partir do acordo com o   tirá no Brasil ao inal do período de implementação do
          Uruguai, consolidado no Mercosul e estendido com os   acordo Mercosul-UE será signiicativamente diferente
          acordos de livre comércio com o restante da América   da que existe hoje. Uma transição bem-sucedida levará
          do Sul, à exceção de Guiana e Suriname. Esses acordos,   a uma indústria mais competitiva, mais especializada
          por sua vez, não exigiram grande esforço de adaptação,   e mais integrada e complementar à indústria europeia.
          na medida em que a indústria brasileira era, em geral,   Uma transição mal conduzida poderá levar ao desapa-
          mais diversiicada e competitiva que seus congêneres  recimento de subsetores com potencial positivo e ao au-
          nos países vizinhos. Em resumo, a indústria brasileira,   mento da dependência tecnológica.
          construída sob elevados níveis de proteção, teve que
          ajustar-se à abertura unilateral, mas não a acordos co-  Há hoje no Brasil uma crescente convergência interna
          merciais. A abertura unilateral não requeria ajustes a  em torno da ideia de que uma maior exposição à com-
          um cenário de eliminação da proteção tarifária, como   petição global é um fator auxiliar da indução da com-
          no caso dos acordos de livre comércio, mas apenas à  petitividade e deveria ser parte das políticas necessárias
          redução do grau de proteção, em muitos setores a ní-  para fazer face ao baixo crescimento da produtividade
          veis ainda bastante confortáveis na comparação inter-  da economia brasileira e do setor industrial na últi-
          nacional.                                           ma década. Na medida em que permitem realizar este
                                                              movimento obtendo em reciprocidade maior acesso a
          Tomando o cenário atual de negociações comerciais   outros mercados, a negociação de acordos comerciais
          preferenciais como um dado, e tendo em vista o mo-  tem sido considerada o método preferido de realizar
          vimento iniciado em 2015 e aprofundado no atual go-  esta abertura.
          verno, teremos um quadro bastante diferente. Como   A transição para a uma maior exposição à competição
          se sabe, foi retomada a negociação birregional de um   internacional, porém, diicilmente será bem-sucedida
          Acordo de Associação entre o Mercosul e a UE, que   de forma automática. A realidade do chamado “custo
          inclui em um de seus pilares uma negociação de li-  Brasil”, ligado a deiciências estruturais de infraestrutu-
          vre-comércio. No próximo ano devem ser lançadas     ra, inanceiras e tributárias, traz consigo desvantagens
          as negociações de um acordo de livre-comércio com   que diicultarão os ajustes ao comércio. A liberalização
          a Associação Europeia de Livre Comércio (European   comercial por meio de acordos, portanto, terá que ser
          Free Trade Association – Eta) – Suíça, Noruega, Lie-  parte de um projeto de reformas mais amplo que ata-
          chtenstein e Islândia, e possivelmente com o Canadá  que estas deiciências de maneira global na economia
          enquanto prosseguem conversas preliminares com Ja-  brasileira.
          pão e Coreia. Estas negociações, se bem-sucedidas, vão
          expor a economia brasileira, em particular a indústria,
          a níveis de concorrência sem precedentes, tendo em
          vista a competitividade de certos setores industriais
          nos países em questão.                              “  A realidade do chamado “custo Brasil”, ligado

          Tomemos, por exemplo, a negociação com a UE, que         a deiciências estruturais de infraestrutura,
          foi retomada este ano em estágio já bastante avança-       inanceiras e tributárias, traz consigo
          do e com objetivo de conclusão em 2018. A UE é, por      desvantagens que diicultarão os ajustes ao
          assim dizer, um dos polos mais competitivos no setor   comércio. A liberalização comercial por meio
          de bens de capital, sob a liderança da Alemanha, mas     de acordos, portanto, terá que ser parte de
          também com destaque para indústrias como a italia-        um projeto de reformas mais amplo que
          na, a francesa ou a espanhola. Portanto, o Brasil, que   ataque estas deiciências de maneira global
          possui um setor diversiicado de bens de capital, estará           na economia brasileira
          exposto, ao inal do período de desgravação, a alguns
          dos produtores mais competitivos do mundo. Por ou-                                                    “

          Nº  129 -  Outubro/Novembro/Dezembro de 2016                                                     65
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