Page 67 - rbce129
P. 67
RBCE - A revista da
consolidadas, como níveis máximos, alíquotas acima tro lado, subsetores competitivos do setor de bens de
das efetivamente praticadas, sob um teto geral no nível capital brasileiro terão oportunidades ampliadas com
de 35%. A abertura comercial unilateral, levada a cabo o acordo, graças ao acesso privilegiado e espaço para
pelo governo Collor, foi a base tanto para esses com- parcerias no mercado europeu.
promissos multilaterais, quanto para o movimento de
negociação de acordos preferenciais regionais amplos, Nesse contexto, a indústria de bens de capital que exis-
iniciado na década de 1990 a partir do acordo com o tirá no Brasil ao inal do período de implementação do
Uruguai, consolidado no Mercosul e estendido com os acordo Mercosul-UE será signiicativamente diferente
acordos de livre comércio com o restante da América da que existe hoje. Uma transição bem-sucedida levará
do Sul, à exceção de Guiana e Suriname. Esses acordos, a uma indústria mais competitiva, mais especializada
por sua vez, não exigiram grande esforço de adaptação, e mais integrada e complementar à indústria europeia.
na medida em que a indústria brasileira era, em geral, Uma transição mal conduzida poderá levar ao desapa-
mais diversiicada e competitiva que seus congêneres recimento de subsetores com potencial positivo e ao au-
nos países vizinhos. Em resumo, a indústria brasileira, mento da dependência tecnológica.
construída sob elevados níveis de proteção, teve que
ajustar-se à abertura unilateral, mas não a acordos co- Há hoje no Brasil uma crescente convergência interna
merciais. A abertura unilateral não requeria ajustes a em torno da ideia de que uma maior exposição à com-
um cenário de eliminação da proteção tarifária, como petição global é um fator auxiliar da indução da com-
no caso dos acordos de livre comércio, mas apenas à petitividade e deveria ser parte das políticas necessárias
redução do grau de proteção, em muitos setores a ní- para fazer face ao baixo crescimento da produtividade
veis ainda bastante confortáveis na comparação inter- da economia brasileira e do setor industrial na últi-
nacional. ma década. Na medida em que permitem realizar este
movimento obtendo em reciprocidade maior acesso a
Tomando o cenário atual de negociações comerciais outros mercados, a negociação de acordos comerciais
preferenciais como um dado, e tendo em vista o mo- tem sido considerada o método preferido de realizar
vimento iniciado em 2015 e aprofundado no atual go- esta abertura.
verno, teremos um quadro bastante diferente. Como A transição para a uma maior exposição à competição
se sabe, foi retomada a negociação birregional de um internacional, porém, diicilmente será bem-sucedida
Acordo de Associação entre o Mercosul e a UE, que de forma automática. A realidade do chamado “custo
inclui em um de seus pilares uma negociação de li- Brasil”, ligado a deiciências estruturais de infraestrutu-
vre-comércio. No próximo ano devem ser lançadas ra, inanceiras e tributárias, traz consigo desvantagens
as negociações de um acordo de livre-comércio com que diicultarão os ajustes ao comércio. A liberalização
a Associação Europeia de Livre Comércio (European comercial por meio de acordos, portanto, terá que ser
Free Trade Association – Eta) – Suíça, Noruega, Lie- parte de um projeto de reformas mais amplo que ata-
chtenstein e Islândia, e possivelmente com o Canadá que estas deiciências de maneira global na economia
enquanto prosseguem conversas preliminares com Ja- brasileira.
pão e Coreia. Estas negociações, se bem-sucedidas, vão
expor a economia brasileira, em particular a indústria,
a níveis de concorrência sem precedentes, tendo em
vista a competitividade de certos setores industriais
nos países em questão. “ A realidade do chamado “custo Brasil”, ligado
Tomemos, por exemplo, a negociação com a UE, que a deiciências estruturais de infraestrutura,
foi retomada este ano em estágio já bastante avança- inanceiras e tributárias, traz consigo
do e com objetivo de conclusão em 2018. A UE é, por desvantagens que diicultarão os ajustes ao
assim dizer, um dos polos mais competitivos no setor comércio. A liberalização comercial por meio
de bens de capital, sob a liderança da Alemanha, mas de acordos, portanto, terá que ser parte de
também com destaque para indústrias como a italia- um projeto de reformas mais amplo que
na, a francesa ou a espanhola. Portanto, o Brasil, que ataque estas deiciências de maneira global
possui um setor diversiicado de bens de capital, estará na economia brasileira
exposto, ao inal do período de desgravação, a alguns
dos produtores mais competitivos do mundo. Por ou- “
Nº 129 - Outubro/Novembro/Dezembro de 2016 65