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Acordos e Política Comerciais



          Alguns mais otimistas defendem que o presidente pode-  mo de solução de controvérsias. As promessas de maior
          ria aproveitar a renegociação do Nata para atualizar os  ativismo na defesa comercial, dirigidas principalmente,
          termos desse acordo, já que a sua coniguração foi dei-  mas não apenas, à China, tendem a aumentar o número
          nida há mais de 20 anos e não contempla uma série de  de litígios comerciais, sobrecarregando os mecanismos
          questões introduzidas pela modernização tecnológica  da organização. É possível que se veja tanto o crescimen-
          nos últimos anos. O curioso é que, para este grupo, a TPP  to do número de casos abertos pelos EUA contra me-
          deveria ser a referência para a modernização do Nata, já  didas protecionistas (subsídios, por exemplo) de outros
          que este acordo incluiu diversos temas que foram levados   países, quanto de questionamentos de outros membros
          recentemente  à mesa de negociação pelos interesses em-  da OMC às novas medidas de proteção anunciadas por
          presariais dos EUA. Mas, como Trump rejeita a TPP...   Trump em sua campanha.

                                                              Trump ameaçou retirar os EUA da OMC, caso a insti-
          •  TTIP
                                                              tuição o impeça de adotar medidas para penalizar as em-
          Embora Trump não tenha mencionado explicitamente a   presas que planejam mover suas fábricas para o exterior
          TTIP como alvo prioritário de sua política comercial, é   (Mauldin, 2016).  Dentre as ameaças feitas à participa-
          pouco provável que as negociações para esse acordo, que   ção dos EUA nos acordos comerciais, a saída da OMC é,
          já enfrentavam forte resistência na UE, possam prospe-  de longe, a de maior potencial explosivo, mas também a
          rar nos primeiros tempos da nova presidência dos EUA.   menos provável.  O país certamente sofreria retaliações,
                                                              inclusive por meio do aumento de tarifas de importação
          Algumas lideranças europeias ainda fazem tentativas de  para produtos em que é muito competitivo e, principal-
          reviver a TTIP, convidando Donald Trump para uma    mente, deixaria de contar com os mecanismos de solu-
          reunião de cúpula EU-US o mais cedo possível (Renda,  ção de controvérsias, dos quais faz uso intensivo.
          2016), mas a Chanceler da Alemanha, Angela Merkel,
          declarou, após a eleição de Trump, que não alimenta  Se a saída da OMC não é provável, pode-se certamente es-
          nenhuma expectativa quanto ao acordo (Borger, 2016).  perar uma retração dos EUA nas negociações pendentes da
                                                              Rodada Doha (que já vinha se fazendo sentir no governo
          As restrições do novo presidente ao TTIP são, possivel-  Barak Obama) e mais ainda na negociação de novos temas.
          mente, de caráter distinto das dirigidas ao TPP. As pre-  Como mencionado anteriormente, uma das críticas centrais
          ocupações de Trump no comércio com os países euro-  da campanha de Trump aos acordos comerciais é a perda de
          peus não se referem à concorrência desleal. Nesse caso, o   autonomia para o país legislar de acordo com seus interesses
          principal problema parece residir no caráter regulatório   econômicos. Os novos temas avançam justamente nessa di-
          da agenda temática das negociações, que avançam na  reção, saindo das questões tradicionais de comércio (tarifas e
          direção de reduzir a autonomia dos países para regu-  barreiras não tarifárias ao comércio de bens) para entrar cres-
          lamentar atividades econômicas, tendência frequente-  centemente nas áreas de regulação econômica.
          mente criticada durante a campanha eleitoral.

          A posição central que as críticas ao Nata e ao TPP assu-
          miram na narrativa de Trump pode indicar que a época  OS IMPACTOS DO BREXIT E
          dos mega-acordos comerciais entrará em “modo hiberna-  DA ELEIÇÃO DE TRUMP PARA
          ção” por algum tempo.  Isso possivelmente é verdade para
          acordos que envolvam os EUA, mas também a UE, que,  A AGENDA DE NEGOCIAÇÕES
          às voltas com o Brexit e com o crescimento da direita na-  COMERCIAIS DO BRASIL
          cionalista, diicilmente avançará em compromissos muito
          ambiciosos nos acordos comerciais internacionais. Mas isso   Como mencionado na introdução deste artigo, o Brasil pode
          não signiica que países em desenvolvimento, ou os desen-  ter chegado em mau momento à festa dos acordos comer-
          volvidos da Ásia-Pacíico, deixem de promover  arranjos re-  ciais. Se o contexto da governança do comércio global já
          gionais ou megarregionais, talvez adaptando suas agendas   vinha passando por transições em que o resultado inal era
          aos temas e dispositivos que lhes sejam mais convenientes.
                                                              bastante incerto, e cuja direção certamente não favorecia o
                                                              comércio e as negociações comerciais, a opção pelo Brexit e a
          •  OMC                                              eleição de Trump tornaram o cenário ainda mais complexo.
          O primeiro impacto da eleição de Trump a ser sentido  A essa altura é importante chamar a atenção que, do pon-
          na OMC deverá ser o aumento do  recurso ao mecanis-  to de vista do comércio, Brexit e Trump são fenômenos

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