Page 52 - rbce129
P. 52
Acordos e Política Comerciais
Alguns mais otimistas defendem que o presidente pode- mo de solução de controvérsias. As promessas de maior
ria aproveitar a renegociação do Nata para atualizar os ativismo na defesa comercial, dirigidas principalmente,
termos desse acordo, já que a sua coniguração foi dei- mas não apenas, à China, tendem a aumentar o número
nida há mais de 20 anos e não contempla uma série de de litígios comerciais, sobrecarregando os mecanismos
questões introduzidas pela modernização tecnológica da organização. É possível que se veja tanto o crescimen-
nos últimos anos. O curioso é que, para este grupo, a TPP to do número de casos abertos pelos EUA contra me-
deveria ser a referência para a modernização do Nata, já didas protecionistas (subsídios, por exemplo) de outros
que este acordo incluiu diversos temas que foram levados países, quanto de questionamentos de outros membros
recentemente à mesa de negociação pelos interesses em- da OMC às novas medidas de proteção anunciadas por
presariais dos EUA. Mas, como Trump rejeita a TPP... Trump em sua campanha.
Trump ameaçou retirar os EUA da OMC, caso a insti-
• TTIP
tuição o impeça de adotar medidas para penalizar as em-
Embora Trump não tenha mencionado explicitamente a presas que planejam mover suas fábricas para o exterior
TTIP como alvo prioritário de sua política comercial, é (Mauldin, 2016). Dentre as ameaças feitas à participa-
pouco provável que as negociações para esse acordo, que ção dos EUA nos acordos comerciais, a saída da OMC é,
já enfrentavam forte resistência na UE, possam prospe- de longe, a de maior potencial explosivo, mas também a
rar nos primeiros tempos da nova presidência dos EUA. menos provável. O país certamente sofreria retaliações,
inclusive por meio do aumento de tarifas de importação
Algumas lideranças europeias ainda fazem tentativas de para produtos em que é muito competitivo e, principal-
reviver a TTIP, convidando Donald Trump para uma mente, deixaria de contar com os mecanismos de solu-
reunião de cúpula EU-US o mais cedo possível (Renda, ção de controvérsias, dos quais faz uso intensivo.
2016), mas a Chanceler da Alemanha, Angela Merkel,
declarou, após a eleição de Trump, que não alimenta Se a saída da OMC não é provável, pode-se certamente es-
nenhuma expectativa quanto ao acordo (Borger, 2016). perar uma retração dos EUA nas negociações pendentes da
Rodada Doha (que já vinha se fazendo sentir no governo
As restrições do novo presidente ao TTIP são, possivel- Barak Obama) e mais ainda na negociação de novos temas.
mente, de caráter distinto das dirigidas ao TPP. As pre- Como mencionado anteriormente, uma das críticas centrais
ocupações de Trump no comércio com os países euro- da campanha de Trump aos acordos comerciais é a perda de
peus não se referem à concorrência desleal. Nesse caso, o autonomia para o país legislar de acordo com seus interesses
principal problema parece residir no caráter regulatório econômicos. Os novos temas avançam justamente nessa di-
da agenda temática das negociações, que avançam na reção, saindo das questões tradicionais de comércio (tarifas e
direção de reduzir a autonomia dos países para regu- barreiras não tarifárias ao comércio de bens) para entrar cres-
lamentar atividades econômicas, tendência frequente- centemente nas áreas de regulação econômica.
mente criticada durante a campanha eleitoral.
A posição central que as críticas ao Nata e ao TPP assu-
miram na narrativa de Trump pode indicar que a época OS IMPACTOS DO BREXIT E
dos mega-acordos comerciais entrará em “modo hiberna- DA ELEIÇÃO DE TRUMP PARA
ção” por algum tempo. Isso possivelmente é verdade para
acordos que envolvam os EUA, mas também a UE, que, A AGENDA DE NEGOCIAÇÕES
às voltas com o Brexit e com o crescimento da direita na- COMERCIAIS DO BRASIL
cionalista, diicilmente avançará em compromissos muito
ambiciosos nos acordos comerciais internacionais. Mas isso Como mencionado na introdução deste artigo, o Brasil pode
não signiica que países em desenvolvimento, ou os desen- ter chegado em mau momento à festa dos acordos comer-
volvidos da Ásia-Pacíico, deixem de promover arranjos re- ciais. Se o contexto da governança do comércio global já
gionais ou megarregionais, talvez adaptando suas agendas vinha passando por transições em que o resultado inal era
aos temas e dispositivos que lhes sejam mais convenientes.
bastante incerto, e cuja direção certamente não favorecia o
comércio e as negociações comerciais, a opção pelo Brexit e a
• OMC eleição de Trump tornaram o cenário ainda mais complexo.
O primeiro impacto da eleição de Trump a ser sentido A essa altura é importante chamar a atenção que, do pon-
na OMC deverá ser o aumento do recurso ao mecanis- to de vista do comércio, Brexit e Trump são fenômenos
50 Nº 129 - Outubro/Novembro/Dezembro de 2016