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RBCE - A revista da
pessoas e capital. No entanto, teria que aceitar a Europeia (TFEU) permita a negociação de novo arca-
implementação da legislação europeia que regula o bouço para as relações entre o RU e a UE antes que o
mercado único, sem poder inluenciá-la, permitir a processo de retirada tenha sido concluído. É possível
livre-circulação de pessoas e manter a contribuição que os membros do bloco decidam adotar uma postura
orçamentária para o bloco – algumas das principais lexível em relação a essa questão e apoiem o progresso
motivações para o Brexit. Por esse modelo, o RU paralelo entre os dois processos negociadores, mas a Co-
não seria parte da união aduaneira da UE, tendo, missão Europeia e o presidente do Conselho Europeu já
portanto, que satisfazer as regras de origem para ter se manifestaram contrários a essa possibilidade.
acesso ao mercado de bens europeu sem pagamento
de tarifas de importação. Além disso, as exportações Um ALC ambicioso, que inclua compromissos em áre-
britânicas passariam a estar vulneráveis à imposição as de serviços e investimentos, atualmente não cobertas
de medidas de defesa comercial. pelas regulações comunitárias, exigirá a sua ratiicação
por cada um dos países do bloco, além do Parlamento
2. Modelo da Suíça: nesse caso, o RU não seria parte Europeu, o que aumenta em muito a sensibilidade aos
da UE ou da EEA, mas negociaria diversos tratados lobbies, que certamente aparecerão. Na área de serviços,
com a UE, sob os quais adotaria normativas euro- por exemplo, as negociações serão complexas. Nessa
peias em áreas especíicas. Esse modelo dá mais le- área, o mercado único é incompleto, com a manutenção
xibilidade ao RU para escolher de que tratados par- de autonomia dos membros em diversos setores. Isso
ticiparia, mas o país não gozaria dos benefícios do signiica que o RU terá que negociar muitos aspectos de
acesso ao mercado único europeu, sendo uma abor- seu comércio de serviços com países europeus individu-
dagem de integração menos profunda que a adotada almente. O Mercado Comum Europeu (MCE) é o des-
pela Noruega. tino de 50% das exportações britânicas de serviços e é o
seu principal parceiro comercial para serviços proissio-
3. Um novo acordo de livre comércio com a UE: nais, cientíicos e serviços técnicos, serviços de informa-
nesse caso, o RU teria que negociar um acordo de ção e comunicações e serviços inanceiros e de seguros.
livre comércio como qualquer outro país não mem-
bro (Canadá, por exemplo). Frente ao risco de que não seja possível negociar um
novo acordo para reger as relações econômicas entre o
4. Cenário MFN (Nação Mais Favorecida – sigla em RU e a UE antes do término das negociações do Artigo
inglês): caso o RU deixe a UE sem lograr negociar 50, Rollo e Winters (2016) recomendam que os dois la-
um acordo alternativo com o bloco, suas relações de dos estendam o status quo em termos de regras de comér-
comércio seriam regidas pelas regras multilaterais cio, até que um acordo de longo prazo seja atingido. Um
da OMC. No caso do comércio de bens, estaria su- problema não desprezível com relação a essa proposta
jeito às tarifas de importação de MFN, e no caso de é que ela signiicaria estender por tempo equivalente
serviços aos compromissos assumidos no General o acesso ao mercado único, mas também traria, como
Agreement on Trade in Services (GATS), condi- contrapartida, o livre movimento de trabalhadores, com
ções muito menos favoráveis do que as que resulta- forte oposição dos que votaram pelo sim ao Brexit.
riam dos cenários anteriores.
Ademais, a decisão de anunciar o acionamento do Arti-
go 50 em março de 2017, combinada ao endurecimento
do discurso sobre imigração, levou o RU para o campo
Em qualquer modelo, o RU não faria mais parte da do hard Brexit, sem que o país tenha antes negociado
união aduaneira do bloco europeu, o que signiicaria informalmente com os pares europeus a garantia de que
que os exportadores britânicos teriam que enfrentar as um acordo interino seria possível. Como aponta Ra-
regras de origem. De acordo com algumas estimativas, chman (2016), assim que o Artigo 50 for acionado, a
isso poderia adicionar entre 4% e 15% aos custos das ex- UE ligará o cronômetro, sabendo que o RU icará em
portações (he Economist, 2016). situação mais vulnerável sem um acordo interino que
garanta ao país condições de acesso preferencial ao mer-
A conclusão de um ALC entre o RU e a UE levaria tem- cado europeu após a sua retirada do bloco.
po, mesmo que esse acordo fosse negociado em paralelo
com as negociações do Artigo 50 para a retirada do país Ainda que, do ponto de vista econômico, a UE não te-
do bloco. De acordo com Rollo e Winters (2016) não nha interesse em levantar barreiras ao comércio com o
está claro que o Tratado de Funcionamento da União RU, do ponto de vista político é possível que a UE seja
Nº 129 - Outubro/Novembro/Dezembro de 2016 43