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Momento Atual








             Em defesa da globalização



















                                                              Lucas Ferraz é ex-secretário de comércio exterior do Ministé-
                                                              rio  da  Economia  (2019-2022)  e  coordenador  do  Centro  de
                                                              Estudos de Negócios Globais da FGV
               Lucas Ferraz



          Em 2004, o renomado economista Jagdish Bhagwati publicou o livro “In defense of Globalization”, inspirado pelos
          protestos antiglobalização realizados na cidade de Seattle, em 1999, quando da realização da terceira reunião minis-
          terial da OMC (Organização Mundial do Comércio). Em seu livro, Bhagwati apresenta uma série de argumentos
          simples e não menos so sticados, mostrando como a globalização em contraste com a super cialidade das críticas
          à época, poderia ser uma alavanca poderosa para o endereçamento de vários problemas sociais, como a redução da
          pobreza e do trabalho infantil, o incentivo ao empreendedorismo feminino ou mesmo a mitigação da degradação
          ambiental. Para ele a globalização, assim como a OMC, era parte fundamental da solução - e não do problema -
          como usualmente apontado.

          De fato, ao olharmos os dados em perspectiva histórica, não é difícil constatar o quanto a globalização avançou nas últi-
          mas décadas e o quanto isso signi cou em termos de aumento da e ciência produtiva e geração de renda em nível global.
          Segundo o Banco Mundial de 1986 a 2008 a corrente de comércio mundial sobre o PIB global, aumentou de 35% para
          61%. Na década de 90 em particular, o comércio internacional cresceu a taxas três vezes superiores ao PIB mundial,
          impulsionado pela criação da OMC e pela formalização de centenas de novos acordos de livre comércio.  uanto ao
          comércio de partes e componentes que na década de 80 representava cerca de 40% das trocas internacionais, esta parti-
          cipação alcança 67% em 2008, consequência da formação das cadeias globais e regionais de valor e do redirecionamento
          do portfólio de investimentos global para os países de mão- de-obra mais barata com destaque para a China.

          Ao longo deste mesmo período, cerca de 1,5 bilhão de pessoas saíram da linha de extrema pobreza no mundo, segundo
          a OMC. Ainda, segundo a mesma instituição, a taxa de pobreza nos países pobres e em desenvolvimento caiu de 40,1%
          em 1995 para cerca de 10,6% em 2022, enquanto a participação destes países nas exportações de bens e serviços globais
          aumentou de 16,5% para 32,2% no mesmo intervalo. Além disso, o desenvolvimento de novas tecnologias de infor-
          mação e comunicação impulsionou o comércio digital e de serviços, aumentando a participação das micro, pequenas
          e médias empresas no comércio exterior e contribuindo para o fortalecimento do empreendedorismo feminino. O
          comércio internacional passou também a ter papel de destaque cada vez maior como via de acesso a novas tecnologias
          limpas, assim como a bens e serviços voltados para a aceleração da transição energética em nível global.

          Em que pesem os ganhos trazidos pelo aumento da integração econômica global das últimas décadas, o número de
          medidas protecionistas vem crescendo signi cativamente ao menos desde a última crise  nanceira global de 2008,
          sobretudo nas economias desenvolvidas. Nestas economias, a ascensão da China como uma superpotência, asso-

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