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China


          mar a indústria por meio da internet das coisas, cloud  O instituto Merics, em 2019, lançou um interessante es-
          computing,  big data  e inteligência arti cial para criar  tudo sobre as políticas que o governo chinês vinha lançan-
          novas formas de interação entre os consumidores e as  do nessa frente tecnológica desde 2015: Made in China
          empresas, a Made in China 2025 previa que, nesse pe-  2025, Outline for Promoting Big Data Development, Fi-
          ríodo de 10 anos (entre 2015 e 2025), a China reduzisse  ve-Year Plan for Scienti c and Technological Innovation,
          a dependência de tecnologias estrangeiras, promovendo  Internet +, CiberSuperpower, Big Data Strategy, Manu-
          a inovação doméstica e a automação em setores como  facturing SuperPower, New Generation AI Development
          robótica, inteligência arti cial, avião e espaçonave, ener-  Plan, e, claro, a Rota da Seda Digital, a nal, depois que a
          gia renovável e novos materiais.                    China atinge a maturidade internamente, ela quer levar o
                                                              seu modelo para o mundo (Shi-Kupfer & Ohlber, 2019).
          Até mesmo o projeto Rota da Seda, lançado por Xi
          Jinping em 2013, inicialmente voltado para a promoção  Essa expansão tecnológica chinesa, contudo, esbarra
          de investimentos em infraestrutura de portos e estradas  na resistência da Europa e dos Estados Unidos. E che-
          nos países membros, passou ao longo dos anos a focar  gamos, então, à questão de termos um mundo dividi-
          mais em projetos de conexão digital. Esses projetos de  do. Não pretendo entrar na delicada arena da política
          conectividade agora são a prioridade dentro da Rota da  internacional e da diplomacia, mas apenas exempli car
          Seda. No Brasil, em 2024, durante a visita de Estado de  como isso afeta o nosso dia a dia. Por exemplo, depois
          Xi Jinping, esperava-se que Lula con rmasse a entrada  que terminei minha última viagem à China, em 2024,
          do Brasil na Rota – o que não aconteceu. Vi várias entre-  fui aos Estados Unidos. Ao chegar lá, na AT&T, tentei
          vistas na TV, na época, falando do foco em infraestrutura  comprar um chip local norte-americano para o meu ce-
          tradicional, o que já estava relativamente ultrapassado,  lular Huawei, e a venda foi recusada. Ele pegou todos os
          pois o governo chinês passou a priorizar outros pilares,  dados do aparelho e anotou informações... se fosse para
          desde 2018, como meio ambiente, saúde e, claro, tecno-  um iPhone, tudo bem, mas para o Huawei não.
          logia, a qual o governo chinês chama de pilares do  “de-
          senvolvimento de qualidade”.                        Em 2018, a Huawei parou de fabricar celulares no Bra-
                                                              sil, enquanto na China continua superativa e acaba de
          Participei, em novembro de 2024, de uma conferência  lançar o modelo ultramoderno trifold, com característi-
          em Cantão, no sul da China, sobre o desenvolvimento  cas de tela dobrável e capacidade de 5G avançada (Savov,
          de qualidade do projeto Rota da Seda. Várias novas ini-  2025). Mas isso não chega ao Brasil, porque a Huawei
          ciativas de conectividade digital foram apresentadas. A  percebeu que não vale a pena fabricar esses telefones
          Rota da Seda é um projeto gigantesco da China que, de  no país, já que não vendem. E não vendem porque apps
          fato, conseguiu grandes resultados na infraestrutura tra-  americanos como o Google, o YouTube e o WhatsApp
          dicional, como listou a professora Claudia Hausner na  estão impedidos de rodar na Huawei desde que ela se
          edição 160 da RBCE (Hausner, 2024). Já foram investi-  envolveu em um caso de violação de segurança de dados
          dos cerca de USD 1 trilhão nesses países membros. Con-  e sofreu sanções por conta disso. Portanto, há tempos
          tudo, desde 2018, passou a existir a Rota da Seda digital.  mantenho dois aparelhos: o Huawei e o iPhone.

                                                              Uso o Huawei quando viajo à China e preciso me co-
                                                              nectar aos apps chineses locais. Enquanto no iPhone, no
                                                              Brasil, uso os apps do dia a dia, em sua maioria ociden-
         “         Para o Brasil, que tem grandes             tais. De chinês, no iPhone, tenho apenas o WeChat, pois

                                                              faz parte da minha rotina e é essencial para a comunica-
                negócios com a China e potencial de           ção com meus parceiros, amigos e clientes chineses.
                   desenvolver outros em diversos             Há, contudo, outros apps chineses disponíveis para bra-
                  setores, é essencial compreender            sileiros, como o VooV, da Tencent, a mesma criadora
                                                              do WeChat. O VooV tem um sistema parecido com o
               essas dinâmicas e estar preparado para         Zoom, porém em chinês. Nas aulas de mandarim que
                   um futuro em que a tecnologia              faço na Unesp, uso bastante o Voov, mas poucos brasi-

                      chinesa tentará estar mais              leiros o utilizam. Nas calls de trabalho, sempre que pre-
                     próxima do nosso cotidiano               ciso conectar o lado brasileiro ao chinês, há uma certa
                                                              disputa. Enquanto os brasileiros tendem a realizar as
                                                        ”     calls  no Teams, Zoom ou Google Meet, o lado chinês

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