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Comentário Internacional











             Ainda bem que eles, os bancos centrais, existem
















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                                                                             é jornalista e economista

               George Vidor



          Nos primórdios do Banco Central do Brasil, quando o câmbio ainda era inteiramente controlado e não havia sido
          adotado o mecanismo de minidesvalorização da moeda, o presidente da instituição  cou atônito ao ser informado,
          por jornalistas, que companhias de saneamento tinham solicitado ao governo reajuste nas tarifas de água após o
          anúncio de um ajuste na cotação do dólar em relação à moeda brasileira da época (já nem lembro qual era).

          Existia alguma relação direta entre o câmbio e as tarifas de água? Os custos dessas companhias de saneamento es-
          tavam atrelados a importações ou a exportações? Tais empresas estavam muito endividadas em moeda estrangeira?

          Na verdade, naqueles tempos existia uma sensação generalizada de que a variação do câmbio se re etia quase que
          imediatamente na in ação doméstica. A cotação do dólar servia de baliza para a determinação de preços em uma
          economia como a brasileira, abundante em monopólios e oligopólios, e pouco exposta à concorrência. Outra baliza
          era o preço da gasolina. “Subiu a gasolina, vai subir tudo”, dizia-se corriqueiramente.

          Muita coisa mudou na economia brasileira (e na economia mundial, com o processo de globalização) desde então.
          Um esforço bem-sucedido de estabilização monetária nos livrou, com o lançamento do Plano Real, de uma in a-
          ção aguda e crônica, que atormentara a maioria dos brasileiros por décadas. O protecionismo continua sendo um
          mal, mas nem de longe o comércio internacional hoje se parece com aquele dos anos 1970 e 1980. Um fenômeno
          assolador sacudiu o comércio: a transformação da antiga China maoísta em uma espécie de fábrica do mundo, im-
          pulsionada por investimentos privados inicialmente em zonas econômicas especiais.

          A expansão das transações  nanceiras em ritmo bem mais acelerado do que o crescimento das trocas de mercadorias
          e da prestação de serviços também tornou tudo mais complexo no que se refere à in ação. E aprofundando esse
          processo, surgiu o euro, uma moeda única – e não sob a forma de algum metal valioso, como na Antiguidade – por
          adesão de diversos países que compõem o maior bloco econômico da face da Terra, a União Europeia.

          No entanto, essencialmente o controle da in ação permanece sendo feito por políticas públicas voltadas para equi-
          librar demanda e oferta. Sim, já que todas as iniciativas para se revogar a mais importante lei da economia, a da
          procura e da oferta, foram em vão.
          No passado, os bancos centrais agiam sobre a oferta de crédito via instrumentos como o encaixe compulsório (par-
          cela de depósitos à vista que obrigatoriamente era recolhida a seus cofres) e o redesconto (empréstimos aos bancos).

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