Page 37 - rbce129
P. 37
RBCE - A revista da
(Rússia, Brasil, Indonésia, África do Sul e França), outros lá cio exterior num momento em que eventos políticos em
permaneceram (Espanha, Turquia, Reino Unido). economias avançadas vêm reletindo reação negativa de
parcela signiicativa de sua população a respeito não ape-
Terceiro, as tendências em curso dos desequilíbrios em nas da migração como também da integração comercial
transações correntes estariam levando à ampliação de al- (Brexit, eleições nos EUA) (Canuto, 2016b).
guns casos de desequilíbrio nas posições líquidas de ati-
vos externos acumuladas desde a crise inanceira global.
Enquanto a posição líquida de ativos externos da China POLÍTICA MACROECONÔMICA
se encaminharia para a estabilidade, outras grandes eco-
nomias acentuariam fortemente suas situações enquanto E COMERCIAL NO FUTURO
devedoras (EUA, Reino Unido) e credoras (Japão, Ale- GOVERNO DE DONALD TRUMP
manha, Holanda). Além disso, a situação líquida de ativos E SUA CONTRAPARTIDA EM
externos de alguns países no centro da crise do euro conti-
nuaria altamente negativa apesar dos anos de ajustamento DESEQUILÍBRIOS GLOBAIS
de luxos, com elevado desemprego e baixo crescimento.
A julgar pela reorientação da política macroeconomica
Em nossa opinião, embora não haja razão para recear al- pré-anunciada pelo futuro presidente dos EUA, Donald
gum tipo de colapso nos grandes luxos inanceiros atra- Trump, e pelo peso de sua economia no mundo, o quadro
vés das fronteiras, os desequilíbrios globais não desapare- dos desequilíbrios globais poderá passar por choques nos
ceram como uma questão, pois revelam que a recuperação próximos anos. Mesmo de forma preliminar, é possível
econômica global pode ter sido aquém da possível devido estabelecer dois possíveis cenários, cuja deinicão depen-
à assimetria contida na combinação de superávits excessi- derá das opções assumidas pela política comercial, acom-
vos em alguns países, e o desempenho macroeconômico, panhando a reorientação macroeconômica.
abaixo do potencial em muitos outros. O im da “era dos
desequilíbrios globais” parece ter sido declarado muito O futuro presidente Trump e sua equipe anunciaram uma
cedo. O argumento de Lord Keynes sobre a assimetria plataforma macroeconômica com forte impacto poten-
dos ajustamentos entre economias deicitárias e exceden- cial: um grande impulso iscal via gastos em infraestru-
tárias continua a ser mais forte do que nunca. tura, cortes de tributos sobre empresas e uma agenda de
desregulamentação (inanceira e ambiental) (Canuto e
O relatório do FMI sugere uma “recalibração” de polí- Cavallari, 2016). Tais componentes subjazem a meta de-
ticas macroeconômicas, trocando o “desvio de demanda clarada de elevação do crescimento econômico dos EUA
externa” por “medidas de estímulo à demanda domésti- para os 4% ao ano, bem acima dos 2% potenciais estima-
ca”. Este seria particularmente o caso para os países – in- dos pelo FMI (IMF, 2016b).
cluindo a Zona do Euro como um todo – que atualmen-
te podem implementar políticas iscais expansionistas e Detalhes importantes ainda estão por ser preenchidos.
que estão recorrendo primordialamente a políticas mo- Por exemplo, quanto do US$ 1 trilhão em investimen-
netárias não convencionais de afrouxamento quantitati- tos prometidos em infraestrutura icará a cargo do setor
vo e juros básicos negativos, as quais têm se tornado na público ou de parcerias público-privadas (PPP) e, por-
margem cada vez mais ineicazes. tanto, quanto recairá sobre déicits e dívida do setor pú-
blico. Conforme sugerido por diferentes experiências ao
Há que se reconhecer a existência de dúvidas sobre até que
ponto as políticas iscais nacionais podem gerar efeitos de
estímulos de demanda transfronteiras. Grandes luxos de
poupança – como os lucros das empresas alemãs ou norte “
-americanas – podem não ser fáceis de redistribuir. Os desequilíbrios globais não desapareceram
como uma questão, pois revelam que a
Daí a prioridade a ser dada às reformas estruturais especíi- recuperação econômica global pode ter sido
cas a cada país lidando com seus obstáculos ao crescimen- aquém da possível devido à assimetria contida na
to e ao rebalanceamento em conta-corrente. Tal objetivo combinação de superávits excessivos em alguns
poderia ser auxiliado por deslocamento transfronteiriço países, e o desempenho macroeconômico,
de pools de poupança atualmente estacionados em ativos abaixo do potencial em muitos outros
de baixo retorno. Paradoxalmente, os desequilíbrios glo-
bais exigem mais investimentos diretos externos e comér- 35 “
Nº 129 - Outubro/Novembro/Dezembro de 2016