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RBCE - A revista da




          (Rússia, Brasil, Indonésia, África do Sul e França), outros lá  cio exterior num momento em que eventos políticos em
          permaneceram (Espanha, Turquia, Reino Unido).       economias avançadas vêm reletindo reação negativa de
                                                              parcela signiicativa de sua população a respeito não ape-
          Terceiro, as tendências em curso dos desequilíbrios em  nas da migração como também da integração comercial
          transações correntes estariam levando à ampliação de al-  (Brexit, eleições nos EUA) (Canuto, 2016b).
          guns casos de desequilíbrio nas posições líquidas de ati-
          vos externos acumuladas desde a crise inanceira global.
          Enquanto a posição líquida de ativos externos da China   POLÍTICA MACROECONÔMICA
          se encaminharia para a estabilidade, outras grandes eco-
          nomias acentuariam fortemente suas situações enquanto   E COMERCIAL NO FUTURO
          devedoras (EUA, Reino Unido) e credoras (Japão, Ale-  GOVERNO DE DONALD TRUMP
          manha, Holanda). Além disso, a situação líquida de ativos   E SUA CONTRAPARTIDA EM
          externos de alguns países no centro da crise do euro conti-
          nuaria altamente negativa apesar dos anos de ajustamento   DESEQUILÍBRIOS GLOBAIS
          de luxos, com elevado desemprego e baixo crescimento.
                                                              A julgar pela reorientação da política macroeconomica
          Em nossa opinião, embora não haja razão para recear al-  pré-anunciada pelo futuro presidente dos EUA, Donald
          gum tipo de colapso nos grandes luxos inanceiros atra-  Trump, e pelo peso de sua economia no mundo, o quadro
          vés das fronteiras, os desequilíbrios globais não desapare-  dos desequilíbrios globais poderá passar por choques nos
          ceram como uma questão, pois revelam que a recuperação  próximos anos. Mesmo de forma preliminar, é possível
          econômica global pode ter sido aquém da possível devido   estabelecer dois possíveis cenários, cuja deinicão depen-
          à assimetria contida na combinação de superávits excessi-  derá das opções assumidas pela política comercial, acom-
          vos em alguns países, e o desempenho macroeconômico,  panhando a reorientação macroeconômica.
          abaixo do potencial em muitos outros. O im da “era dos
          desequilíbrios globais” parece ter sido declarado muito  O futuro presidente Trump e sua equipe anunciaram uma
          cedo. O argumento de Lord Keynes sobre a assimetria  plataforma macroeconômica com forte impacto poten-
          dos ajustamentos entre economias deicitárias e exceden-  cial: um grande impulso iscal via gastos em infraestru-
          tárias continua a ser mais forte do que nunca.      tura, cortes de tributos sobre empresas e uma agenda de
                                                              desregulamentação  (inanceira e ambiental) (Canuto e
          O relatório do FMI sugere uma “recalibração” de polí-  Cavallari, 2016). Tais componentes subjazem a meta de-
          ticas macroeconômicas, trocando o “desvio de demanda  clarada de elevação do crescimento econômico dos EUA
          externa” por “medidas de estímulo à demanda domésti-  para os 4% ao ano, bem acima dos 2% potenciais estima-
          ca”. Este seria particularmente o caso para os países – in-  dos pelo FMI (IMF, 2016b).
          cluindo a Zona do Euro como um todo – que atualmen-
          te podem implementar políticas iscais expansionistas e   Detalhes importantes ainda estão por ser preenchidos.
          que estão recorrendo primordialamente a políticas mo-  Por exemplo, quanto do US$ 1 trilhão em investimen-
          netárias não convencionais de afrouxamento quantitati-  tos prometidos em infraestrutura icará a cargo do setor
          vo e juros básicos negativos, as quais têm se tornado na   público ou de parcerias público-privadas (PPP) e, por-
          margem cada vez mais ineicazes.                     tanto, quanto recairá sobre déicits e dívida do setor pú-
                                                              blico. Conforme sugerido por diferentes experiências ao
          Há que se reconhecer a existência de dúvidas sobre até que
          ponto as políticas iscais nacionais podem gerar efeitos de
          estímulos de demanda transfronteiras. Grandes luxos de
          poupança – como os lucros das empresas alemãs ou norte  “
          -americanas – podem não ser fáceis de redistribuir.      Os desequilíbrios globais não desapareceram
                                                                      como uma questão, pois revelam que a
          Daí a prioridade a ser dada às reformas estruturais especíi-  recuperação econômica global pode ter sido
          cas a cada país lidando com seus obstáculos ao crescimen-  aquém da possível devido à assimetria contida na
          to e ao rebalanceamento em conta-corrente. Tal objetivo   combinação de superávits excessivos em alguns
          poderia ser auxiliado por deslocamento transfronteiriço   países, e o desempenho macroeconômico,
          de pools de poupança atualmente estacionados em ativos      abaixo do potencial em muitos outros
          de baixo retorno. Paradoxalmente, os desequilíbrios glo-
          bais exigem mais investimentos diretos externos e comér-                                         35 “

          Nº  129 -  Outubro/Novembro/Dezembro de 2016
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