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Editorial
Cenários para 2024-2025
A primeira intervenção no mercado de câmbio no atual governo do presidente Lula realizada este mês, por meio de
swap cambial, revela uma assimetria de “informações” entre os operadores desse mercado que resulta numa maior
volatilidade da taxa nominal de câmbio real/dólar. Cumpre destacar que o atual presidente do Bacen veio a público
a rmar que a operação foi motivada por um vencimento de títulos públicos atrelados ao câmbio, e que isso foi ex-
pressamente pontuado na comunicação do Banco Central, mas parte dos agentes não teria compreendido essa ação e
a interpretou como uma possível alteração na condução da regra da política cambial num regime de câmbio exível.
A atual maior volatilidade da taxa de câmbio nominal, em parte, é fruto das divergências das análises existentes no
mercado com relação à evolução provável do setor externo brasileiro e à sua conexão com o mercado global. O Brasil
apresenta uma conta de capital aberta quase sem restrições administrativas que permite uma livre movimentação e
um a uxo de capitais estrangeiros para entrar na economia brasileira, obter rendimentos pelos seus investimentos,
e depois do período de maturação da aplicação em que se auferiram resultados, os capitais retornam para seus países
de origem.
Muitos desses capitais estrangeiros são aqui aplicados em operações com títulos e haveres – privados ou públicos
– no mercado, havendo registros de sua entrada, uso e destinação junto ao Bacen e/ou à Susep. Normalmente, as
aplicações desse capital são de curto prazo e sua livre movimentação é in uenciada pelo diferencial das taxas de
juros interna e externa, e pela expectativa da evolução e da condição provável no curto e médio prazo da política
monetária e scal tanto no Brasil quanto, sobretudo, nos Estados Unidos. Em função disso, nesses primeiros meses
de 2024, parte da volatilidade cambial, e consequente elevação do volume de saída de capital estrangeiro em inves-
timento em carteira no mercado doméstico observada no momento presente, é explicada:
a) pela incerteza quanto à contenção dos gastos públicos e das regras de política scal, apesar dos anúncios e da
comunicação do atual governo de perseguir uma meta de zerar o dé cit orçamentário; e
b) pela permanência do viés de estabilidade da taxa de juros norte-americana.
Vale lembrar que há capitais estrangeiros que são investidos diretamente nas empresas aqui instaladas ou em pro-
jetos que serão realizados de expansão produtiva, inclusive ligados à exportação de hidrogênio verde. Esses são
contabilizados na conta do balanço de pagamentos de capital de investimento. Nesses primeiros meses de 2024, os
dados mostram uma retração no patamar de atração de investimento em relação ao mesmo período de 2023. Parte
dessa retração pode ser explicada pelo fato de que as liais norte-americanas instaladas no Brasil não estão conse-
guindo implantar processos de nearshoring de produção com suas matrizes, pois estas estão priorizando suas ações
de mudanças na cadeia de valor no México, o que explica o crescimento das exportações mexicanas para os Estados
Unidos. Porém, ainda há a possibilidade de que as empresas estrangeiras aqui instaladas possam implantar estraté-
gias de nearshoring na sua cadeia global de valor na medida em que houver mais clareza das condições de acesso no
Brasil ao nanciamento e seguro de crédito para exportar bens de maior valor agregado do Brasil, sobretudo para
a América Latina e a África. Contudo, a recuperação dessa conta possivelmente ocorrerá com aprovação do regime
regulatório de hidrogênio verde, que permitirá que os inúmeros memorandos de entendimento rmados com os
governos estaduais e os investidores estrangeiros possam vir a ser implantados no Brasil.
Essas duas rubricas do setor externo mais o comportamento histórico de citário da conta de serviços acabam con-
tribuindo para o surgimento de um dé cit em transações correntes no balanço de pagamentos brasileiro. Com um
volume de reservas internacionais de cerca de U$ 353 bilhões e com superávit comercial de cerca de U$ 90 bilhões
nas mãos das exportadoras nacionais para fazerem preferencialmente dispêndios em produtos e serviços impor-
tados, não se faz necessário ajustar neste momento o setor externo brasileiro, via mudança de preços relativos da
relação dólar/real tanto em termos nominal quanto efetivo.
2 Nº 158 - Janeiro, Fevereiro e Março de 2024